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Em Nota, pastorais do campo como o Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP/MG), a Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG), o Conselho Indigenista Missionário (CIMI) Regional Leste e a Cáritas Brasileira Regional Minas Gerais denunciam a violência cometida contra um casal de idosos no município de São Francisco, norte de Minas Gerais. O casal Ornel Fernandes da Mota (76 anos) e Rosita Nascimento da Mota (74 anos), denunciam que foram brutalmente agredidos por um homem, supostamente conhecido como Amadeu Raimundo do Nascimento.
O Senhor Ornel, já com idade avançada, sequer teve chances de se defender. Ele levou 15 pontos na cabeça. Já Rosita machucou praticamente o corpo inteiro, as partes mais atingidas foram as costas e sua parte íntima. O agressor tem sido denunciado de maneira sistemática pela comunidade, mas as autoridades como a polícia e a prefeitura do município não tem dado resposta. As pastorais cobram ação das autoridades estatais em combater a violência e exigem a demarcação dos terrenos da União na região para evitar os conflitos latifundiários cada vez mais constantes.
Confiram a Nota na íntegra logo abaixo ou em anexo!
“Spes non confundit”, ou seja, “a esperança não confunde”
COMO ESPERANÇAR DIANTE DE TANTA VIOLÊNCIA?
Como Peregrinas e Peregrinos da Esperança, enquanto pastorais sociais, viemos denunciar a agressão contra casal de Pescadores e Vazanteiros artesanais em Território Tradicional no munícipio de São Francisco, norte de Minas Gerais. No dia 05 de fevereiro de 2025, quarta-feira, às 07h00 horas da manhã, o casal Ornel Fernandes da Mota (76 anos) e Rosita Nascimento da Mota (74 anos), idosos, denunciam que foram brutalmente agredidos por um homem, supostamente conhecido como Amadeu Raimundo do Nascimento, brasileiro, casado, professor, residente na cidade de São Francisco, estado de Minas Gerais.
A agressão ao senhor Ornel aconteceu com três pedaços de pau: um acertou na mão, o segundo na região dos rins, e o terceiro na cabeça. O Senhor Ornel, já com idade avançada, sequer teve chances de se defender. Ele levou 15 pontos na cabeça. A senhora, desesperada para salvar seu esposo, puxou o agressor pela gola da camisa, foi quando o agressor teria desferido golpes contra ela. Ela machucou praticamente o corpo inteiro, as partes mais atingidas foram as costas e sua parte íntima, razão pela qual foi registrado apenas a foto da sua mão totalmente inchada com a agressão (vide foto abaixo). Conforme afirmam as vítimas, no dia da agressão o suspeito também estava portando um facão.
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IMPUNIDADE DO SUPOSTO AGRESSOR
O suspeito, Amadeu Raimundo, se diz proprietário de uma fazenda que fica às margens do Rio São Francisco, no território tradicional pertencente a Ilha da União. Ele possui centenas de cabeças de gado e porcos que vem reiteradamente prejudicado muitas roças e vazantes. Ele cria os animais utilizando o manejo livre, com os rebanhos soltos, o que ocasiona prejuízos nas plantações dos vizinhos tradicionais.
Conforme relatos das vítimas, no dia 05 de fevereiro de 2025 eles estavam passando próximos a casa do suposto agressor. Ao cumprimentar, o senhor Ornel avisou ao fazendeiro que o gado estava comendo sua plantação, e ele e sua esposa foram recebidos a pancadas pelo Amadeu que é conhecido na região pelo seu temperamento explosivo.
A questão que preocupa os moradores é que os órgãos locais até hoje vêm fazendo pouco caso da agressão, e a própria polícia militar afirmou que a investigação não resultaria em nada. “A situação tá ficando cada dia mais pior, o policial que se dirigiu até o hospital para registrar o Boletim de Ocorrência virou para a enfermeira que atendia os idosos e falou assim: - isso aí não vai dar em nada". Relata moradora da comunidade tradicional vizinha, Ilha da Porteira.
Preocupados com a inércia da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), alguns comunitários da Ilha da União foram até a assistência social do Município de São Francisco conversar com o responsável, ocorre que o secretário não recebeu os comunitários alegando estar em uma reunião. “Desde o dia que aconteceu que eu tô tentando falar para ele mandar os conselheiros do idoso e eu não consigo falar, ele atende e desliga, as vezes atende e fala - depois eu falo com a senhora - e não retorna as ligações.” Afirma moradora da mesma comunidade das vítimas, Ilha da União.
É importante salientar que a criação de gado livre que ocorre às margens do Rio São Francisco, terras da União, também é caracterizado como crime ambiental. E esta infração não acontece de hoje, ela vem ocorrendo há anos. Apenas no ano passado, cinco vazanteiros tradicionais pertencentes a Ilha da União ajuizaram processo judicial (vide números abaixo) contra o fazendeiro em razão da destruição do gado em suas plantações. Mas a justiça segue sendo lenta e falha. "Mas a justiça de São Francisco só olha pro lado de quem tem dinheiro, nós pobre somos ignorados perante eles". Lamenta vizinha das vítimas.
Números dos processos judiciais: 5000226-53.2024.8.13.0611 5000902-98.2024.8.13.0611 5002992-79.2024.8.13.0611 5003019-62.2024.8.13.0611 5003020-47.2024.8.13.0611 |
A represália do fazendeiro suspeito é tamanha ao ponto que ele vem destruindo tantas plantações, o que obriga os vazanteiros, sem saída, a vender o pedacinho de terra para ele e buscar outro local. Desse modo, ele vem dominando e conquistando áreas.
Além disso, no ano passado foi instaurado um inquérito pela polícia civil contra este mesmo suspeito, em razão dele ter proferido ameaças de agressão com arma de fogo em desfavor de dois homens que vivem e trabalham ali na região.
Número do processo: 5003101-93.2024.8.13.0611, Nº PCnet: 2023-611-000505-007-014376478-49, Nº FATO/REDS: 2023-043800586-001 |
A falta de regularização fundiária facilita situações como essas, já que grande parte das áreas da União estão nas mãos de fazendeiros e latifundiários, deixando as famílias tradicionais cada dia mais em situação de vulnerabilidade.
A IMPORTÂNCIA DA CELERIDADE DA DEMARCAÇÃO DAS ÁREAS DA UNIÃO
Os idosos agredidos são pescadores e vazanteiros artesanais da Comunidade Tradicional Ilha da União. A demarcação das terras da União é uma demanda histórica dos povos e comunidades tradicionais, que dependem desses territórios para manter seus modos de vida e garantir a continuidade de suas práticas culturais e produtivas. Terras alagáveis e marginais sempre foram entendidas coletivamente como pertencentes à União, mas, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, quando os direitos territoriais desses povos passaram a ser reconhecidos, muitas comunidades foram expulsas à força de seus territórios, vítimas da violência promovida por jagunços de fazendeiros e da apropriação indevida de áreas públicas pelo latifúndio.
A violência continua!!! E a falta de reconhecimento dos territórios ameaça à segurança e a permanência dos povos das águas no Norte de Minas Gerais.
O processo de demarcação das áreas da União já deveria estar avançado. Uma decisão judicial, fruto de uma Ação Civil Pública contra a SPU (processo nº 1004394-29.2019.4.01.3807, em trâmite na 3ª Vara Federal de Montes Claros-MG), determinou que a secretaria realizasse a demarcação até dezembro de 2023. No entanto, a SPU solicitou sucessivas prorrogações, adiando o prazo para dezembro de 2024 e, mais recentemente, pedindo mais 120 dias, o que empurra a previsão de conclusão para abril de 2025.
A demora na demarcação significa mais um ciclo de incertezas e insegurança territorial.
EM DEFESA DAS COMUNIDADES TRADICIONAIS
Como os antigos hebreus no exílio, que se perguntavam, “mas como podemos cantar ao Senhor em terra estrangeira?” (Sl 137,4). Nós enquanto, pastorais sociais da Igreja, na vivência do Ano Jubilar, nos 2025 anos que Jesus apresentou a centralidade do projeto de Deus: que todos tenham vida e vida em abundância", na certeza de que a "Esperança não se confunde", afirmamos que é hora de "esperançar”, para isto é preciso que as áreas da União sejam reconhecidas e destinadas aos povos e comunidades tradicionais.
Como “esperançar em terras onde parece não haver nada que esperar?” Como esperançar diante de tanta impunidade? Conclamamos os órgãos competentes a tomarem as devidas providências. Enquanto “Igreja em Saída” sabemos ser nosso dever ético-cristão cobrarmos justiça aos pobres de Deus.
Assinam:
Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras – CPP/MG
Comissão Pastoral da Terra – CPT/MG
Conselho Indigenista Missionário – CIMI Regional Leste
Cáritas Brasileira Regional Minas Gerais