Com propostas construídas na Conferência Livre do Meio Ambiente dos Povos das Águas, a pesca artesanal participou da 5ª CNMA levando suas pautas à etapa nacional — um processo construído pelas comunidades com apoio do CPP na mobilização, escuta e articulação
Texto: Henrique Cavalheiro - Assessoria de Comunicação do CPP | Fotos: arquivo pessoal / Fernando Donasci/MMA / Fernando Donasci/MMA
Com propostas pautadas na justiça climática, nos direitos territoriais e no reconhecimento dos saberes tradicionais, os Povos das Águas participaram ativamente da 5ª Conferência Nacional do Meio Ambiente (CNMA), realizada entre os dias 6 e 8 de maio, em Brasília (DF). Eleita durante a Conferência Livre do Meio Ambiente dos Povos das Águas, realizada com apoio do Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP), a pescadora Francislourdes Santos, militante do Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP), levou à etapa nacional as demandas das comunidades pesqueiras, reafirmando a urgência da proteção ambiental com protagonismo popular.
Também marcaram presença na 5ª CNMA as pescadoras Eliana Marques Barros, pescadora e artesã da comunidade Cachoeira do Choro, zona rural de Curvelo (MG), atingida pela barragem de Brumadinho; Josineide Cruz Marques, marisqueira do povoado Ouricuri, na zona rural de Estância (SE), além de Néia Vieira, marisqueira de Cariacica (ES) e liderança do MPP. As três participaram como delegadas eleitas nas etapas municipais. Também esteve presente Andrea Rocha, secretária de Território e Meio Ambiente do CPP.
A participação foi fruto de um processo de escuta e mobilização coletiva. O CPP incentivou ativamente a presença de agentes de pastoral, pescadoras e pescadores nas conferências municipais, estaduais e nas conferências livres. Em parceria com a Articulação Nacional das Pescadoras (ANP) e o Observatório da Pesca Artesanal, realizou uma Conferência Livre dos Povos das Águas, onde foram debatidas as consequências das mudanças climáticas e elaboradas propostas baseadas em experiências territoriais.
5ª Conferência Nacional do Meio Ambiente
A 5ª CNMA marcou a retomada da participação popular na formulação de políticas ambientais no Brasil. Iniciada em 2024, a conferência contou com mais de 900 atividades autogestionadas e conferências livres, municipais e intermunicipais, envolvendo diretamente 2.570 municípios em todo o país. Na segunda etapa, as conferências estaduais e distrital selecionaram 539 propostas prioritárias e elegeram os delegados e delegadas para a fase nacional, realizada de 6 a 9 de maio de 2025, em Brasília (DF).
Com a participação de 1.501 representantes da sociedade civil, setor privado e governos, a etapa nacional priorizou 100 propostas organizadas nos eixos temáticos de Mitigação, Adaptação e Preparação para Desastres, Justiça Climática, Transformação Ecológica e Governança e Educação Ambiental. Dentre essas, 10 foram eleitas como prioritárias. Coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), com correalização da Flacso Brasil e da Universidade de Brasília (UnB), a 5ª CNMA acontece 11 anos após sua última edição e tem como tema central a emergência climática e a transformação ecológica.
“Estamos diante de uma responsabilidade que transcende o tempo, pois diz respeito à vida das futuras gerações. E nós mesmos temos apenas o tempo da emergência. É, portanto, com esse sentido de responsabilidade e urgência que vamos cumprir o objetivo da CNMA: fortalecer o Sistema Nacional de Meio Ambiente e subsidiar para o enfrentamento da emergência climática com propostas de mitigação e adaptação, com justiça climática em nosso país. Mais ainda, avançar na agenda de transformação, apoiando a transição ecológica cujos primeiros passos já estão sendo dados pelo Brasil para liderar através do exemplo um esforço que deve ser de todos os países e povos da Terra”, celebra Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima.
A voz das águas: pescadora artesanal leva vivência e propostas da pesca artesanal à 5ª CNMA
A participação na 5ª CNMA foi um momento importante para Francislourdes Santos, pescadora artesanal da comunidade Santana do Ituqui, em Santarém (PA), e delegada eleita na Conferência Livre de Meio Ambiente dos Povos das Águas. Para ela, estar em Brasília representando pescadoras e pescadores foi essencial. “É importantíssima a participação dos povos de comunidades pescadoras e ribeirinhas — tanto indígenas quanto quilombolas — porque é um plano que fala de nós, que é para nós. Então, é de suma importância a nossa participação. Como criar um plano sem a nossa presença, sem que sejamos nós a falar o que sentimos, o que vivemos?”, afirmou Francislourdes, destacando a centralidade dos povos das águas e comunidades tradicionais nas políticas ambientais.
Durante os grupos de trabalho, ela sentiu que ainda há pouco conhecimento sobre a diversidade dos povos das águas. “Falta mais diálogo, falta mais participação. Eles confundem ribeirinho com pescador. Eu sou pescadora, mas não sou ribeirinha. E veio uma colega de lá que é ribeirinha, mas não é pescadora, é agricultora. Para os demais delegados, ribeirinho é pescador — e nós não somos, é uma outra atividade”, explicou, ao defender a especificidade do modo de vida das pescadoras artesanais. Entre os temas debatidos que mais a marcaram, Francislourdes destacou a importância do “desmatamento zero”, da “demarcação dos territórios” e da denúncia da “falta de apoio do poder público para as comunidades e os povos tradicionais”.
Quando perguntada sobre sua relação com o meio ambiente, a resposta veio com firmeza: “O meio ambiente é a minha vida, de onde eu tiro meu sustento, a minha sobrevivência. É o meu modo de viver, da terra, das águas, da natureza. Eu sou uma pessoa livre”. Ela também apontou a necessidade de que, para as próximas conferências, haja mais apoio dos municípios, estados e poderes públicos para garantir a participação efetiva das comunidades tradicionais.
“Foi muito proveitoso. A gente teve como falar, teve vez, teve voz”, concluiu.