Desde a semana passada, o governo ampliou a pressão sobre o Ibama, acelerou planos para a exploração de petróleo e aderiu à Opep+. Quais os impactos para o meio ambiente e as comunidades tradicionais? Entenda!
Assessoria de comunicação Campanha Mar de Luta
A pressão para liberar a exploração de petróleo na Margem Equatorial, e intensificar a exploração no país, voltou com força ao centro do debate político e ambiental no Brasil. O tema, que já gerou embates no passado, foi reacendido após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticar publicamente o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e defender que a Petrobras seja autorizada a avançar nos estudos para extração de petróleo na região. A declaração, feita na última semana, gerou forte reação entre comunidades tradicionais, especialmente da pesca artesanal, e acendeu um alerta para ambientalistas e pesquisadores.
A Campanha Mar de Luta, que há 5 anos denuncia os riscos da atividade petrolífera para os territórios pesqueiros, vê com preocupação o movimento do governo para flexibilizar a exploração na Margem Equatorial e em outras regiões do território nacional. Além das ameaças ambientais e sociais para as populações costeiras, especialistas alertam que a decisão pode colocar o Brasil na contramão da transição energética global, aprofundando a dependência dos combustíveis fósseis em um momento crítico da crise climática.
O tema ganhou novos desdobramentos ao longo dos últimos dias, com falas de ministros, reações de ambientalistas e mobilizações contra a liberação da exploração petrolífera na região. Acompanhe a cronologia dos acontecimentos e os impactos dessa pressão política sobre o futuro dos territórios pesqueiros e do meio ambiente.
Lenga- lenga é destruir o meio ambiente
A declaração do presidente Lula, feita em entrevista à Rádio Diário de Macapá, no dia 12 de fevereiro, gerou forte reação entre ambientalistas e servidores do Ibama. Lula criticou o órgão por não liberar a pesquisa para exploração de petróleo na Margem Equatorial, afirmando que o governo “não pode ficar nesse lenga-lenga” e que o Ibama “parece ser um órgão contra o governo”. A fala levanta preocupações sobre pressão política sobre uma entidade técnica, cuja função é garantir que projetos de alto impacto ambiental sejam rigorosamente analisados antes de qualquer aprovação.
Não é tolerável, em uma república democrática, que um órgão de fiscalização ambiental, com base técnica e um histórico de compromisso com a proteção do meio ambiente, seja pressionado por interesses políticos. A tentativa de enquadrar o Ibama como um entrave ignora sua função essencial de defesa dos ecossistemas e do equilíbrio climático, além de desconsiderar os impactos diretos para as comunidades tradicionais, que serão os mais afetados pela possível exploração petrolífera na região.
A Mar de Luta critica veementemente essa interferência política e destaca que as falas de Lula contradizem os compromissos assumidos pelo próprio governo. O presidente foi eleito com um discurso de proteção ambiental, prometendo enfrentar os desafios da crise climática e garantir que o Brasil adotasse um modelo de desenvolvimento sustentável. No entanto, pressionar um órgão ambiental para flexibilizar exigências técnicas e abrir caminho para combustíveis fósseis na Margem Equatorial vai na contramão das promessas de campanha e dos compromissos internacionais do país. O Brasil sediará a COP-30 em 2025, e não há justificativa aceitável para que o governo intensifique a exploração de petróleo enquanto o mundo busca alternativas para reduzir as emissões de carbono.
Até de uniforme da Petrobrás
Simbolicamente trajado com o uniforme da estatal, no dia 17 de fevereiro, durante um evento da Petrobras, Lula voltou a atacar o órgão ambiental e, ao lado de outras autoridades, defendeu a intensificação da exploração petrolífera no Brasil. O gesto e as declarações do presidente deixam evidente o alinhamento do governo com os interesses da indústria do petróleo, em detrimento das preocupações ambientais e do clamor das comunidades tradicionais afetadas.
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A insistência de Lula em deslegitimar o Ibama aproxima o Brasil de um perigoso cenário de retrocesso ambiental, no qual decisões técnicas passam a ser questionadas e enfraquecidas por pressões políticas. O Ibama já negou, com base em estudos técnicos, a licença para a Petrobras perfurar a Foz do Amazonas, apontando riscos ambientais e a ausência de garantias para a proteção da biodiversidade marinha.
Durante o evento, Lula reafirmou o compromisso do governo com a exploração de petróleo, deixando claro que essa é uma prioridade da Petrobras. “Vamos continuar [...] pesquisando petróleo, produzindo petróleo, refinando petróleo porque essa é uma missão que está nas mãos de vocês da Petrobras”, declarou o presidente.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, reforçou a narrativa de que a exploração da Margem Equatorial poderia trazer crescimento econômico para o Brasil, comparando o potencial da região ao boom do petróleo na Guiana. “Essa reserva, talvez maior que a do pré-sal, já está mudando a realidade dos nossos vizinhos. O PIB da Guiana cresceu 50% no último ano. O Brasil merece, em especial os nossos irmãos nortistas e nordestinos, viver essa realidade”, afirmou.
Seguindo o mesmo tom, a presidenta da Petrobras, Magda Chambriard, defendeu que a exploração da Margem Equatorial é necessária para manter os níveis de produção de petróleo do país após 2030, quando as reservas do pré-sal começarem a declinar. “A partir daí, a reposição de reservas é urgente, e isso só vai ser possível se nós começarmos a explorar novas fronteiras agora. É muito importante destacar a relevância da Margem Equatorial e da pesquisa do seu real potencial. Se nós obtivermos a licença, faremos tudo de forma extremamente segura, quanto a isso o senhor [presidente Lula] pode ficar absolutamente tranquilo”, declarou, se dirigindo ao presidente.
As falas reforçam a crescente ofensiva política e empresarial para flexibilizar a legislação ambiental e pressionar o Ibama, desconsiderando os alertas das comunidades tradicionais, ambientalistas e especialistas sobre os impactos irreversíveis da exploração petrolífera na Margem Equatorial.
Para a Mar de Luta, a Margem Equatorial não pode ser reduzida a um recurso econômico. É um território vivo, habitado por pescadores, ribeirinhos e povos indígenas, que dependem da integridade dos ecossistemas marinhos para sua sobrevivência e cultura. O avanço do petróleo na região representa mais uma ameaça a esses modos de vida, além de colocar o Brasil na contramão das soluções urgentes para frear a crise climática global.
Mais um leilão do fim do mundo
Na esteira da recente pressão pela exploração de petróleo na Margem Equatorial, o governo federal anunciou, um leilão para 68 novos blocos na Amazônia Legal, aprofundando a expansão da atividade petrolífera em áreas de alta sensibilidade ambiental. Ao todo, 47 desses blocos estão na Foz do Amazonas. Outros 21 blocos estão na Bacia do Parecis, em terra, localizados nos estados de Mato Grosso e Rondônia, cercando terras indígenas e unidades de conservação, o que levanta preocupações sobre o impacto em áreas protegidas.
O leilão foi divulgado pela Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) e está previsto para ser realizado em 17 de junho, em sessão pública. Além dos blocos na Foz do Amazonas, a nova rodada de leilões inclui áreas na bacia Potiguar, no Rio Grande do Norte, também na Margem Equatorial, e outras localizadas no litoral nordestino, Sul e Sudeste. Ao todo, 332 blocos serão ofertados a empresas petroleiras em todo o país, intensificando a expansão da exploração de combustíveis fósseis em um momento em que o Brasil deveria estar alinhado com a transição energética global.
Guinada em direção à expansão da exploração de petróleo
No dia 18 de fevereiro, em mais um movimento que reafirma a guinada do governo em direção à expansão da indústria petrolífera, o Brasil aceitou o convite para integrar a Opep+, grupo que reúne os principais países produtores e exportadores de petróleo do mundo. A decisão, anunciada pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, representa um novo marco na política energética do país, reforçando a estratégia de intensificação da exploração de combustíveis fósseis.
Para a Campanha Mar de Luta, essa decisão desconsidera o papel histórico do Brasil como um líder ambiental nas negociações climáticas globais e enfraquece os compromissos do país em relação ao meio ambiente. O Brasil está priorizando a queima de combustíveis fósseis em vez de investir em alternativas sustentáveis, aprofundando os riscos ambientais e sociais para as comunidades tradicionais e ampliando sua responsabilidade na crise climática.
Enquanto o governo reforça sua aposta no petróleo, as comunidades pesqueiras seguem sem respostas sobre os impactos da extração de óleo, a falta de reparação pelo crime do petróleo de 2019 e a ameaça constante aos seus territórios. A adesão à Opep+ é mais um passo na direção errada, ignorando a urgência climática e o apelo de milhares de pessoas que vivem das águas e para as águas.