No segundo dia do Grito da Pesca 2019, pescadores e pescadoras dialogam sobre suas vidas.
Lorenza Strano, assessora de comunicação da Cáritas de Crateús.
Frente ao desastre do óleo no litoral do nordeste e outras regiões que já estão contaminadas, a difícil conjuntura atual que afeta a classe trabalhadora e a categoria da pesca, após a Audiência Pública na Câmara dos Deputados, militantes do MPP se reuniram para uma análise do momento que o Brasil está vivendo.
“Temos um milhão de pescadores e pescadoras no nosso país e mais de 400 mil vivem no Nordeste, são trabalhadores e trabalhadoras que tem uma relação muito forte com a natureza, com o território, com a tradição e são responsáveis pela movimentação econômica de vários municípios”, argumentou o professor Cristiano Ramalho, professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), apresentando dados da Estatística Pesqueira de 2007. “Depois do derramamento do óleo estão sofrendo uma grave crise, a queda da venda do pescado é, no mínimo, de 80%”.
As consequências e os impactos desse crime ambiental, segundo o professor, são terríveis para os homens, mas devastadores para as mulheres, porque a maioria dos produtos capturados por elas, como os mariscos, absorvem mais o óleo. E com as pescadoras sofrem, também, as comunidades inteiras, porque a pesca não é só uma atividade econômica, ela é uma forma de ser, de viver e se o território é condenado a sofrer, a atividade da pesca artesanal é prejudicada e, consequentemente, a identidade, a autonomia e a soberania dos povos das águas”.
“A garantia da segurança alimentar está sendo atacada pelos grandes empresários e os comerciantes que estão difundindo a ideia que os produtos da pesca artesanal estão contaminados, seguem o plano perverso de suspender a pesca e bloquear a continuidade histórica das comunidades pesqueiras”, afirmou o Professor da UFPE.
Na mesma linha de alarme, o dirigente nacional do MST, Alexandre Conceição, expressou a solidariedade do povo da terra o qual, segundo ele, é complementário ao mundo da água e que, nesse momento, quer fortalecer a parceria e a união para limitar os avanços do capitalismo.
“Fazer análise de conjuntura é como fazer uma rede de pesca, vamos colocar um pedaço após o outro, e assim vamos entender que o que acontece está dentro da crise da América Latina onde o povo está lutando para resistir e subverter a ordem dada pelo capital”, declarou o dirigente.
A reflexão de Alexandre trouxe vários elementos que caracterizam o governo Bolsonaro e que estão preocupando, sobretudo, pela ‘desproteção’ do meio ambiente, cujo cuidado é fundamental para quem trabalha com água e terra. Os exemplos são a reforma da previdência, o Programa Verde-Amarelo do governo Bolsonaro, que intenciona isentar milhões de reais para os empresários, em troca da contratação de jovens entre 18 e 29 anos. O valor da isenção, no entanto, seria pago pelos desempregados que estivessem recebendo o seguro desemprego e passariam a contribuir com o INSS, o que hoje não acontece. Além disso, Conceição criticou também a venda dos territórios dos povos tradicionais para investidores estrangeiros.
Os três acidentes ambientais, os mais desastrosos dos últimos anos, Brumadinho, as queimadas na Amazônia e o derramamento de óleo no litoral foram apontados como episódios que marcam um caminho perigoso que leva às mudanças climáticas e à destruição das tradições a favor dos grandes projetos e das grandes empresas.
Segundo a Coordenadora Nacional do MPP, Josana Pinto, que também compôs a mesa de análise, esses projetos são projetos de morte, como a mineração e a construção das barragens, e tem como único objetivo expulsar pescadores e pescadoras dos territórios ancestrais, prejudicando a sustentabilidade, a sobrevivência e a tradição.
“É hora da gente se mobilizar contra tudo isso, estamos em luta mas precisamos fazer mais, não podemos deixar espaço ao conformismo, estamos perdendo território, é momento de libertação e de sonhar juntos um sonho coletivo, de massa, de toda a sociedade”, concluiu Josana.
Após a análise de conjuntura, vários representantes dos estados presentes fizeram o uso da fala trazendo histórias e vivências até do interior do Ceará. “Tem um povo que ficou muito invisível, o mais invisível de todos e que sofre muito também a causa das mineradoras, é o povo dos açudes do sertão. Eles e elas também estão aqui presente na luta para se somar a vocês e com a união superar esse momento difícil”, afirmou Marciel Melo, da Cáritas Diocesana de Crateús, que desenvolve um projeto de resgate da comunidade pesqueira dos açudes, junto ao CPP no semiárido brasileiro.