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Pescadores discutem no FAMA as consequências da privatização das águas nas comunidades pesqueiras

19-03-2018
Fonte: 

Assessoria de comunicação do CPP

Restrições de acesso aos rios, mares, lagoas. Mangues destruídos pela carcinicultura, portos que impedem o exercício da pesca. Os pescadores e pescadoras artesanais conhecem de Atividade no FAMA 2018, discute a privatização das águasperto os entraves e perigos da privatização das águas. No dia de ontem (18/03), eles tiveram a oportunidade de discutir essa situação na atividade autogestionada "Articulação dos Pescadores e pescadores artesanais contra a privatização da água", um dos eventos que aconteceram no Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA), na Universidade de Brasília (UNB), que desde o dia 17 já teve mais de 200 atividades realizadas e propostas pelos grupos que estão presentes no evento.

A pescadora Rita de Cássia da Silva, que faz parte da rede Manguemar e do Movimento dos Pescadores e Pescadoras artesanais (MPP) relatou como grandes empreendimentos tem prejudicado a pesca em Macau, no Rio Grande do Norte. "Temos conflito com a CAERN, a empresa de saneamento básico do Rio Grande do Norte, com a carcinicultura e com as usinas de energia eólica. Eles chegam colocando cercas, expulsando gente de quilombo. Nós queremos um saneamento básico que respeite a nossa tradição", defende Rita.

Rita apontou também a preocupação dela com o mangue. "Esse povo de fora chega e destroi o nosso mangue, que é berçário de várias espécies. ".

A secretária-executiva do Conselho Pastoral dos Pescadores nacional, Ormezita Barbosa, trouxe dados gerais sobre os vários empreendimentos que têm privatizado as águas e que têm prejudicado as comunidades pesqueiras em várias partes do país. "Os territórios pesqueiros têm sido alvos do capital. O nordeste têm sido bastante prejudicado pelas usinas eólicas. A mudança no código florestal fez com que a carcinicultura voltasse com força, destruindo várias áreas de mangue. A mineração tem causado todos esses impactos no Rio Doce e mais recentemente em Barcarena (PA). Também há conflitos ligados à indústrial naval". 

Ormezita fala do lançamento de um novo relatório de Conflitos socioambientaisOrmezita também apresentou a tentativa de implantação de um grande empreendimento de aquicultura feita pelo antigo Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), no estado de Pernambuco. Apesar de não ter dado certo, o modelo que ali foi pensado permanece nas atuais políticas do Estado para a pesca. "Há uma perspectiva de manter os projetos de privatização das águas, mesmo após o fim do MPA. Os empresários da aquicultura pedem para deixarem de ser da pasta da pesca e passarem a ser do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA), o que pode piorar ainda mais o processo de implantação desses empreendimentos", critica.

Ormezita ainda se preocupa com a atual situação de privatização das águas. "Por esse motivo, vamos lançar até o fim do ano um segundo relatório de conflitos socioambientais que dê vidibilidade aos conflitos das comunidades pesqueiras por água", prometeu.

Para o pescador Manoel Bueno do MPP, mais conhecido como Nego da Pesca, discutir a privatização da água, que é o objetivo do FAMA, era algo impensado até algum tempo atrás. "Jamais pensei ter que discutir a perda do direito à água", lamenta. Ele lembrou dos perigos da privatização causados pela indústria petrolífera. "Os estados do Rio de Janeiro, Bahia e Espírito Santo estão já mapeados pela indústria petrolífera. Os problemas já começam no momento de implantação, quando são feitas  as pesquisas sísmicas, que impactam as nossas águas. Esse é o modelo de desenvolvimento que vivemos hoje no Brasil", critica.

Nego também lembrou dos impactos do crime da Samarco nos estados de Minas Gerais e Espírito Santo, que já começam a se alastrar para os estados da Bahia e do Rio de Janeiro. "Nada foi feito para interromper o crime de Mariana. O MPF parece que não tem mais força. Precisamos nos juntar para arrumar uma forma de ultrapassarmos essas barreiras", defende Nego.

O pescador Carlos Alberto dos Santos, da CONFREM, concorda. "Não dá para essa luta ser apenas dos povos das marés e dos rios. Precisamos juntar as nossas bandeiras paraCarlos dos Santos aponta as graves consequências do crime de Mariana fazermos as lutas junto com os povos do Cerrado, da Caatinga, da Amazônia, com todos", defende. Carlos também apontou que não há novidade nas informações que estão sendo reveladas nas discussões. "Nós vivenciamos isso todos os dias nas nossas comunidades. As estações de tratamento jogam esgoto nos nossos manguezais. A carcinicultura realiza um processo de esterilização gradual dos mangues", denuncia. 

Carlos alertou para as graves consequências do crime da mineradora Samarco, em Mariana (MG). "O risco de contaminação é enorme, porque peixes que se reproduzem no Rio Doce são alimentos dos peixes marinhos daquela região. Além disso, essa situação que aconteceu em Mariana (MG) está ameaçando causar danos em Abrolhos (BA), o lugar de maior biodiversidade do Atlântico Sul", denunciou.

Carlos defendeu a importância da realização do FAMA. "É importante lembrar que enquanto estamos discutindo o direito ao uso público da água, outro Fórum acontece com o interesse de privatizar as nossas águas", alertou.

Josana Serrão defende o território pesqueiro e a luta conjuntaPara a pescadora Josana Serrão do MPP, uma saída para barrar a privatização das águas nas comunidades pesqueiras é o projeto de lei de iniciativa popular proposto pelo Movimento dos Pescadores e Pescadoras artesanais que visa criar o dispositivo legal que reconhece e assegura o Território Pesqueiro. "O nosso conceito de território engloba terra e água. Trazemos o território no seu sentido mais amplo, respeitando o nosso modo de ser e a nossa cultura. É preciso que o nosso território seja respeitado para que tenhamos vida saudável", defende. 

Josana alerta para os mais diferentes tipos de privatização das águas. "Estamos vivendo um intenso momento de retrocessos e nós brasileiros estamos adormecidos. Se já vivemos todos esses perigos com a privatização das águas de superfície, imagine com a privatização das águas subterrâneas, como as do aquífero Guarani", alerta. "Queremos ser pescadores com vida e história. Temos que ficar atentos, preparados e unidos para lutar. Porque ou a gente luta ou a gente morre!", finalizou.

 

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