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Enquanto o Brasil não ouvir a gente, o país só perde: Juventudes debatem Racismo Ambiental e Justiça Climática

Jovens de diversas regiões se reúnem em Salvador/BA para debater as ameaças e o impacto devastador da crise climática sobre as comunidades tradicionais

27-09-2024
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Texto: Henrique Cavalheiro - Assessoria de Comunicação do CPP-Nacional | Fotos: Ingrid Campos 

Teve início nessa sexta-feira (27), em Salvador/BA, o ‘Encontro sobre Mudanças Climáticas, Racismo Ambiental e Comunicação com a Juventude’, promovido pelo Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP). O evento reúne jovens de diversas identidades, incluindo comunidades pesqueiras e quilombolas, com o objetivo de discutir os desafios que enfrentam em seus territórios. Após uma mística de abertura e a apresentação dos participantes, a primeira roda de conversa foi conduzida por Thuane Nascimento, conhecida como Thux, militante da Perifa Connection e da Coalizão Negra por Direitos no Rio de Janeiro.

Neste primeiro momento, o debate focou no racismo ambiental e nas mudanças climáticas, destacando o impacto direto desses fatores na vida das comunidades tradicionais. Foram apresentados conceitos essenciais para auxiliar na compreensão do cenário ambiental e climático atual, conectando a degradação dos territórios à luta por justiça socioambiental.

Thux destacou a importância de repensar o papel dos territórios periféricos e tradicionais na luta por justiça climática. Segundo Thuane, “todo lugar que é marginalizado é periferia. No Brasil, o centro acumula tudo, política pública, privilégio, as melhores escolas, espaços de cultura. Os centros recebem tudo, e as periferias não recebem nada”. Isto causa uma disparidade de oportunidades e acentua as ameaças aos mais pobres e vulneráveis.

A questão do racismo ambiental, termo, cunhado na década de 1980 por Benjamin Franklin Chavis Jr., surgiu durante os protestos contra o depósito de resíduos tóxicos em áreas predominantemente negras no condado de Warren, nos Estados Unidos. Essa discriminação racial, que submete comunidades vulneráveis à degradação ambiental, no Brasil se amplia para incluir outros grupos, como indígenas, quilombolas, pescadores e ribeirinhos. Assim, as mudanças climáticas impactam de maneira desigual as regiões com maior população negra e pobre.

As soluções para o Brasil estão nos territórios

A facilitadora ressaltou que a narrativa comum sobre as periferias precisa ser desmistificada, pois são nesses territórios que resistências e soluções emergem. “Viver no poder da periferia para a periferia poder viver e ter bem-viver. Pensar nas confluências, os problemas do Brasil passam pelo território. Enquanto o Brasil não ouvir a gente, os governantes só perdem”, afirmou ela, defendendo que as comunidades periféricas precisam ser ouvidas.

Além disso, foi discutido o conceito de justiça climática e a disparidade entre os responsáveis pelas mudanças climáticas e as comunidades que sofrem as consequências, colocando as populações mais pobres em "zonas de sacrifício", onde os danos ambientais se acumulam de forma desproporcional. A justiça ambiental visa assegurar que nenhuma comunidade suporte sozinha o ônus das políticas econômicas predatórias.

Quem sofre? Quem paga? Quem ganha? 

A jovem também chamou a atenção para a intersecção entre as questões ambientais e sociais. Ela criticou a visão de que os impactos das mudanças climáticas são provocados por todas as pessoas igualmente enquanto sociedade. “Agora vamos usar o termo justiça climática. Sabe quem contribui para o agravamento das mudanças climáticas? Não somos nós, nosso tipo de ser humano, mas são os ricos. Este é o nível de diferença entre nós e os grandes poluidores”, frisou.

Ao abordar a realidade das favelas e comunidades tradicionais, Thuane destacou a falta de acesso a direitos básicos e a degradação do território. “Eu já nasci em um território degradado, as favelas já nascem degradadas, pois nunca tivemos acesso a moradia, e tivemos que ir para lugares que não eram bons de morar, porque o poder público nunca garantiu isso pra gente”, disse. Ela ainda comparou: “Em toda a minha favela não há uma árvore, só no cemitério que fica ao lado. Os mortos têm sombra e acesso à natureza, e as pessoas vivas não têm na periferia”. Isto é um exemplo de racismo ambiental, pois segundo a militante, a maioria das pessoas destas comunidades são pretas ou pardas, e a desproporcionalidade de acesso à natureza e aos recursos básicos para a existência digna.

Para Thuane, o território é central nas soluções para o Brasil. “O território é a coisa mais importante. As soluções para o Brasil estão nos territórios, inclusive para discutir as mudanças climáticas”, concluiu, apontando para a necessidade de ouvir e valorizar as comunidades tradicionais e periféricas na formulação de políticas públicas.

Juventude consciente e lutadora 

Os participantes do encontro tiveram a oportunidade de compartilhar suas percepções, trazendo para o debate as realidades de seus territórios em relação ao racismo ambiental e aos impactos das mudanças climáticas. Eles destacaram a interconexão entre território e pessoas, ressaltando que não há como pensar em transformações sem levar esses elementos em consideração.

Jovens do Ceará, por exemplo, relataram como a implantação de energias renováveis transformou seus territórios em zonas de sacrifício, com as eólicas ameaçando suas comunidades. Esses empreendimentos, que chegam com promessas de desenvolvimento, acabam deixando apenas destruição, tanto na saúde quanto na economia local. Outro problema levantado foi a mineração, que polui açudes e rios, colocando em risco o modo de vida das comunidades pesqueiras.

O encontro, que vai até domingo, ainda abordará como a comunicação, promovida pelos próprios jovens em seus territórios, pode contribuir para a mudança de paradigmas, amplificando as vozes das comunidades tradicionais e combatendo as injustiças socioambientais que enfrentam diariamente.