O debate sobre os desafios e barreiras enfrentados por pescadores e pescadoras artesanaois do Brasil, vem chamando cada vez mais a atenção da sociedade. Assim o Instituto Humanitas Unisinos – IHU, que é um órgão transdisciplinar da Universidade do Vale do Rio dos sinos – UNISINOS, São Leopoldo/RS, que visa apontar novas questões e busca respostas para os grandes desafios de nossa época, procurou a Secretária Nacional do Conselho Pastoral dos Pescadores, Maria José Pacheco para uma entrevista sobre a conjuntura nacional que a pesca artesanal no brasil vem enfrentado. Com o título “HIDRONEGÓCIO ATINGE A PESCA ARTESANAL”, a IHU Online publicou no dia 16 de agosto de 2012. Acompanhe trechos, depois click no link e confira a entrevista na íntegra.
IHU On-Line – O que define a pesca artesanal? O que é um território tradicional pesqueiro e qual é o tamanho da comunidade pesqueira artesanal no Brasil?
Maria José Pacheco – A pesca artesanal é aquela desenvolvida pelo pescador, sozinho, com a sua família, ou com regime de parceria, ou seja, é feita pelo próprio trabalhador para garantir a sua sobrevivência e a da família. O conceito de pesca artesanal adotado pelo governo considera embarcação com arqueação bruta (AB) menor de 20, e pesca desenvolvida de forma autônoma. Nós definimos como a pesca desenvolvida pela própria comunidade, onde os conhecimentos são passados de pai para filho, de geração em geração, reunindo conhecimentos ancestrais e tradicionais. Nesse sentido, a pesca artesanal não é só uma profissão, mas também um jeito de viver e de se relacionar com a natureza; ela é um modo de vida, um trabalho livre, autônomo e coletivo. Os pescadores têm um jeito tradicional de viver e de lidar com a natureza; eles têm histórias e raízes profundas.
-*-*-*-
IHU On-Line – O que é a Campanha Nacional pela Regularização dos Territórios das Comunidades Tradicionais Pesqueiras?
Maria José Pacheco – Os pescadores querem uma lei semelhante a dos indígenas e quilombolas, porque são comunidades tradicionais. De acordo com o artigo 215 da Constituição Federal, o Brasil tem o compromisso de garantir todas as formas culturais que coexistem no país. Os pescadores são um grupo próprio, com uma tradição cultural e um jeito de fazer próprio. Portanto, nesse sentido o Brasil tem o compromisso de manter esse patrimônio cultural.
O governo assinou a Convenção 169 da OIT, que garante os direitos das comunidades tribais, tradicionais. Entretanto, ainda não existe uma lei específica que garanta o direito das comunidades ao território, e elas ficam à mercê de empreendimentos, de fazendeiros e empresas que querem retirá-las das suas áreas. Há uma campanha por uma lei de iniciativa popular que visa juntar mais de 1 milhão e 385 mil assinaturas para que o Congresso Nacional reconheça e aprove uma lei que garanta a permanência das comunidades nos territórios onde estão e de forma sustentável.
-*-*-*-
IHU On-Line – Qual é avaliação do Movimento sobre a criação e o trabalho desenvolvido pelo Ministério da Pesca?
Maria José Pacheco – Nossa avaliação é de que o Ministério da Pesca não foi constituído para favorecer a pesca artesanal, mas sim para as grandes empresas e a pesca em grande escala, numa perspectiva industrial e concentradora. O Ministério da Pesca se estrutura principalmente para atender a esse interesse e pouco investe em uma política que desenvolva os trabalhadores que vivem da pesca. Do ponto de vista artesanal, o Ministério tem políticas compensatórias, fragmentárias, ou seja, não se trata de uma política pública, que invista no potencial produtivo das comunidades pesqueiras. É difícil saber o tamanho da comunidade pesqueira artesanal no Brasil, porque o governo sempre tenta negar o número de pescadores, o valor e a importância econômica deles. De todo modo, a estimativa é de que haja mais de 1,5 milhão de trabalhadores envolvidos diretamente na pesca, sem considerar os trabalhadores indiretos, que trabalham nos mercados, nas feiras, e que vivem através da pesca.
Na tentativa de desregular a legislação que protege as comunidades pesqueiras, temos informações de que o Ministério atuou tentando influenciar na revisão do Código Florestal, no sentido de identificar os “apicuns”, que são áreas dos ecossistemas de manguezais importantes para a reprodução das espécies. O Ministério atuou para que essas áreas não fossem classificadas como áreas do ecossistema manguezal e para que deixassem de ser áreas de proteção permanente, o que facilitaria a exploração e a atividade de cafiniculltura no local. O Ministério também tem feito legislações para intervir no processo de regulamentação da privatização das águas e para criminalizar os pescadores, afirmando que há pessoas que não trabalham realmente com a pesca.
Leia a Entrevista na íntegra.