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Comunidade pesqueira de Garapuá lança manifesto contra ocupação do seu território

Comunidade pesqueira da Ilha de Tinharé (BA) é ameaçada por especulação imobiliária 

21-08-2018
Fonte: 

CPP Regional Bahia/Sergipe

                             Comunidade de Garapuá

 

Fazendeiros, grandes empresas e especuladores estão impedindo o acesso da comunidade pesqueira de Garapuá ao seu território pesqueiro. Localizada na Ilha de Tinharé, município de Cayru (BA), o local abriga alguns dos locais turísticos mais visitados na Bahia, como o Morro de São Paulo. O avanço dos empreendimentos turísticos e da especulação imobiliária tem criado dificuldades para a comunidade ter acesso aos manguezais, matas rios e lagoas.

Confira a carta na íntegra!


Expansão imobiliária viola meio ambiente e direitos fundamentais da Comunidade tradicional de Garapuá

A comunidade de Garapuá, localizada na ilha Tinharé - Bahia, é uma vila de pescadores e pescadoras que possuem formas próprias de organização social, cultural e econômica. Os integrantes da comunidade ocupam e usam o território e os bens ambientais de acordo com suas tradições e como condição para o desenvolvimento comunitário. É, portanto, uma Comunidade Tradicional Pesqueira, sendo seu território, cultura, modo de vida e sustento, protegidos por Lei.

No entanto, a comunidade vem sofrendo com o avanço desenfreado do capital imobiliário. Cada dia que passa a expansão imobiliária aumenta, com o cercamento das áreas da comunidade para fins de especulação e com a implantação de um conjunto de novos loteamentos, que têm impactado diretamente o modo de vida, as formas de sobrevivência e o território da comunidade.

Loteadores, fazendeiros, especuladores e grandes empresários têm impedido o acesso às áreas de pesca e extrativismo da comunidade, como manguezais, matas, rios, lagoas, entre outros. Áreas de lazer, como campos de futebol e margens de lagoas e do mar estão sendo cercadas. Cada vez mais, os caminhos tradicionais, que permitem o deslocamento da comunidade, estão sendo fechados. Pescadores e Marisqueiras estão perdendo os espaços para colocar os seus equipamentos e apetrechos de pesca. Essas são áreas de uso comum da comunidade sendo essenciais ao seu modo de vida e convivência, devendo ser garantido pelo Poder Público sua proteção e o livre acesso. 

Além disso, os novos empreendimentos imobiliários têm aumentado e irão aumentar o desmatamento, a poluição das águas, a produção de lixo, o desrespeito ao modo de vida e a paisagem local. O que se vê é um constante desrespeito à natureza, e à cultura da comunidade.

A expansão do capital imobiliário gera também outros problemas para a comunidade:

- A privatização, especulação e concentração fundiária aumentam o preço das terras, e as perguntas que ficam são: onde vão morar os filhos e filhas, os integrantes da comunidade, que não têm condições de pagar pelos altos preços dos terrenos e das moradias? Será que em Garapuá vai acontecer o mesmo que no Morro de São Paulo (Comunidade vizinha a Garapuá), onde grande parte dos nativos e de seus filhos tiveram que migrar para outras cidades da região ou morar em lugares apertados e precários da localidade?

- O modelo de desenvolvimento dos grandes empreendimentos imobiliários e turísticos são geradores de diversos impactos negativos para a economia local, como é bem visível também no caso do Morro de São Paulo. Neste modelo, os integrantes das comunidades tradicionais, quando muito, se transformam em mão de obra barata, fazendo apenas serviços menos valorizados, enquanto os trabalhos com melhores salários ficam para pessoas de outras cidades e até de outros países. Os empreendimentos do turismo comunitário, geridos pelos próprios integrantes das comunidades, como pequenos e médios restaurantes e pousadas, residências de hospedagem, transporte marítimo e terrestre, vendas de artesanato, entre outros, vão perdendo espaço diante da competição com os grandes investidores de fora. 

Em uma ação mais recente, empresários estão tentando fazer novas construções e implantar grandes loteamentos às margens da lagoa, que é a principal fonte de abastecimento de água na comunidade. A poluição e destruição da vegetação do entorno da lagoa (que é uma Área de Preservação Permanente, a ser protegida em cem metros da sua borda, de acordo com o Código Florestal) já estão gerando e vão gerar sérios prejuízos para a comunidade e para o meio ambiente. Além disso, algumas áreas nas margens da lagoa são utilizadas pela comunidade de forma ambientalmente sustentável, através do extrativismo de frutas e folhas e de práticas de lazer, que serão impedidas com os novos empreendimentos. A implantação destas obras e loteamentos representará um verdadeiro desrespeito ao meio ambiente e ao direito ao território tradicional da comunidade!

De acordo com a Lei, o Poder Público (Poder Executivos, Legislativo e Judiciário da União, dos Estado e dos Municípios) tem o dever de preservar e proteger o meio ambiente e o território das comunidades tradicional. Cabe a ele garantir o meio ambiente ecologicamente equilibrado (Art. 225, Constituição Federal), impedindo a destruição das matas, a poluição das águas e a

implantação de obras e empreendimentos de impacto nas Áreas de Preservação Permanente. É dever do Poder Público, também, proteger o território, a cultura, o modo de vida e de sobrevivência das comunidades tradicionais, a exemplo das pesqueiras e extrativistas (Art. 215 e 216 Constituição Federal e Decreto nº 6.040, de 7 de fevereiro de 2007). No caso de Garapuá, como o território da comunidade está localizado na ilha de Tinharé, ou seja, em ilha de propriedade da União, deve ser garantida a prioridade na destinação das terras para a comunidade tradicional de Garapuá (Lei 9.636/98).

No entanto, mesmo com toda a legislação obrigando o Poder Público a proteger o território da comunidade e o meio ambiente, o que se tem assistido são as autoridades locais, estaduais e nacionais desrespeitando a lei, ao aprovar a implantação dos loteamentos, ao se omitir ou apoiar a invasão dos territórios da comunidade pelos empresários e a destruição das áreas de

preservação, ao emitir concessões e autorizações de uso das terras para  grandes fazendeiros e especuladores imobiliários em detrimento da comunidade. 

Mas a invasão e desrespeito ao território da comunidade tradicional de Garapuá têm sido questionado por seus integrantes! Denúncias estão  sendo feitas junto a órgãos públicos e a comunidade têm resistido como pode a essas violências. Diante da recente de invasão das margens da lagoa, com a tentativa de implantação um grande loteamento, houve uma ação coletiva e imediata de proteção da posse da comunidade com a retirada das cercas que foram colocadas ilegalmente no local. Um ato legítimo e legal de proteção possessória, ou seja, nada mais do que o exercício do seu direito de proteger o território, e de forma conjunta o meio ambiente, a economia e a cultura da comunidade!

 

Linha de ação: