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CPP lamenta aprovação do PL das Eólicas no Mar pelo Senado

Projeto que segue para sanção presidencial ameaça territórios pesqueiros, foi construído sem ouvir pescadores e pescadoras e inclui “jabutis fósseis” que favorecem fontes poluentes

13-12-2024
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Texto: Comunicação do CPP / Fotos: Saulo Cruz e Edilson Rodrigues/Agência Senado 

O Plenário do Senado aprovou, nesta quinta-feira (12), o Projeto de Lei 576/2021, conhecido como PL das Eólicas no Mar, que regulamenta a exploração de energia offshore no Brasil. A matéria segue agora para a sanção presidencial, carregando em seu texto dispositivos polêmicos e perigosos, como incentivos às termelétricas a gás e carvão mineral – os chamados "jabutis fósseis".

O Conselho Pastoral dos Pescadores e Pescadoras (CPP) expressa profunda preocupação e repúdio ao texto aprovado, que ignora completamente os impactos socioambientais nos territórios pesqueiros e desconsidera os direitos das comunidades tradicionais. 

A pescadora artesanal Daina Andrade, do estado do Piauí, expressou sua preocupação com a aprovação do PL 576/2021. Para ela, a medida representa uma ameaça direta à pesca artesanal, à biodiversidade marinha e aos estuários, áreas essenciais para o sustento das comunidades pesqueiras. “Nas áreas que a gente vai buscar o nosso sustento, a pesca é o nosso trabalho, é o nosso modo de vida desde sempre. Com a instalação das eólicas no mar, tudo vai ficar mais difícil, porque nas comunidades não chega ninguém para fazer nenhuma consulta, para saber o que a gente acha dessas instalações desses grandes parques”, desabafou Daina, destacando a falta de diálogo com os pescadores e pescadoras.

A aprovação da lei reforça a sensação de invisibilidade das comunidades pesqueiras, segundo Daina. “A pesca, as águas do mar, são a nossa sobrevivência. É de lá que vamos buscar o nosso sustento. E com a aprovação dessa lei, todos nós vamos sofrer com esses impactos”, afirmou. A pescadora alertou para os impactos negativos que o projeto trará, desde o prejuízo à biodiversidade até a dificuldade de manter a pesca artesanal como meio de vida. “É triste que as comunidades não sejam ouvidas, que os pescadores não sejam consultados. As nossas comunidades vivem e sobrevivem da pesca, e com as eólicas no mar, vai ficar muito difícil para os pescadores e pescadoras”, finalizou.

O CPP manifesta seu pesar diante da aprovação do projeto, destacando que, apesar dos esforços e mobilizações, não foi possível impedir sua tramitação. A pastoral ressalta que a decisão evidencia mais uma vez a força do lobby do setor energético, que prioriza o lucro em detrimento do meio ambiente e dos direitos das comunidades impactadas.

O PL das Eólicas no Mar, que agora segue para sanção presidencial, foi construído sem incluir de forma adequada as comunidades pesqueiras no processo, seja por meio de audiências públicas, das quais pescadores e pescadoras foram excluídos, seja pela consulta prévia, livre e informada, conforme previsto na Convenção 169 da OIT e destacado, inclusive, nos artigos no projeto. A ausência dessa escuta evidencia a hipocrisia e incoerência de uma iniciativa que, ao invés de respeitar os direitos das comunidades tradicionais, os ignora e ignora os impactos que esses empreendimentos podem causar em seus territórios tradicionais. 

Além de ameaçar modos de vida, a instalação desordenada de eólicas offshore pode causar graves danos ao meio ambiente, como o comprometimento de ecossistemas marinhos, a interrupção de rotas de pesca e a desestruturação de cadeias alimentares. Estudos indicam ainda que as vibrações e emissões sonoras das turbinas podem afetar espécies aquáticas, impactando diretamente a biodiversidade e, consequentemente, a sustentabilidade das atividades pesqueiras. O CPP em carta lançada na última quarta-feira (11), alerta para os riscos de priorizar interesses econômicos em detrimento da preservação ambiental e da dignidade das comunidades locais.

* CLIQUE AQUI e leia a carta do CPP sobre o PL das Eólicas no Mar 

Por 40 votos a 28, os senadores mantiveram dispositivos, o que é ainda mais absurdo, que prorrogam incentivos fiscais para termelétricas a gás natural e carvão mineral, uma evidente contradição em uma lei que dizia querer promover a transição energética sustentável. Além disso, o processo legislativo ignorou a participação das comunidades diretamente impactadas, destacando uma falha grave na condução desse debate.

Durante a sessão, o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), criticou duramente a inclusão desses dispositivos. “Não é jabuti, é um dinossauro. Essa proposta vai aumentar 7,5% a conta de luz dos brasileiros. Não podemos compactuar com uma medida que prejudica consumidores e incentiva fontes poluentes”, afirmou.

Outros parlamentares também se posicionaram contra os "jabutis". O senador Otto Alencar (PSD-BA) apresentou um destaque para excluir esses dispositivos do texto, mas foi derrotado. Alencar destacou o caráter poluente e antieconômico das termelétricas a carvão. “Estamos votando um projeto que mistura energia limpa com fontes altamente poluentes, que ainda por cima aumentarão os custos para o consumidor. É inaceitável.” Apesar das críticas, o texto foi aprovado e segue agora para sanção presidencial.

Exclusão sistemática 

Apesar das tentativas de diálogo por parte do CPP, incluindo o regional Maranhão, estado de origem do relator do PL, foi enviado um ofício ao senador Weverton Rocha (PDT-MA), destacando os perigos do PL 576/2021, os apelos foram completamente ignorados. O documento enfatizava a necessidade de salvaguardas socioambientais para proteger os territórios pesqueiros tradicionais e as rotas de pesca, propondo a inclusão de um parágrafo que evitasse o impacto das eólicas offshore sobre a pesca artesanal. Além disso, o CPP alertou para os danos causados pelas eólicas onshore, como prejuízos à saúde e ao sustento das comunidades pesqueiras, reiterando a importância de uma transição energética que respeite os direitos humanos e ambientais. No entanto, assim como os pescadores e pescadoras, o ofício não recebeu a atenção devida, evidenciando a exclusão sistemática dessas comunidades nas decisões que afetam seus modos de vida.

O agente de pastoral do CPP/MA, Padre Mardonio Brito, destacou que a experiência do CPP junto aos pescadores e pescadoras já demonstra os impactos negativos dos parques eólicos em terra e alerta para as consequências ainda mais graves no mar. “A vida dos pescadores e pescadoras estará ainda mais em risco com esses projetos de eólicas offshore. Isso ameaça e prejudica a soberania alimentar do povo das águas, além de potencializar conflitos violentos nos territórios pesqueiros”, afirmou.

Para o Padre Mardonio, os projetos representam um avanço apenas para o lucro de grandes empresários, enquanto significam um retrocesso para os modos de vida e a segurança alimentar das comunidades pesqueiras. “É um ‘progresso’ para o capital, mas na verdade representa um retrocesso para o povo das águas. Nesse sentido, é urgente incidir para que haja possibilidades de resguardo da pesca artesanal”, finalizou.

Agora, as atenções se voltam ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com a expectativa de que ele vete os dispositivos que favorecem o carvão e o gás natural, uma medida que, embora paliativa, é necessária diante dos danos que o projeto das eólicas no mar já representa.

A aprovação das eólicas offshore trouxe um sentimento de profunda tristeza para pescadores e pescadoras como Daina, do Piauí, que veem seus territórios e modos de vida ameaçados. "A pesca artesanal, como vai ficar?", questiona ela, ao destacar os impactos negativos que esses empreendimentos podem causar nos estuários, na biodiversidade e na própria pesca, que é a base de sobrevivência das comunidades tradicionais. “Sabemos que, de alguma forma, o mar, as águas, o ar, ficam todos poluídos com essas eólicas. A nossa vida está ameaçada por esses grandes empreendimentos”, desabafou. Para a pescadora e tantos outros, a falta de consulta, na construção deste PL, às comunidades pesqueiras reforça a invisibilidade de quem vive e luta pelos territórios. "É o que sabemos fazer, é pescar", conclui, alertando para o futuro incerto da pesca artesanal diante da expansão desses empreendimentos.

Eólicas no mar, não! 

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